terça-feira, 17 de março de 2009

O casamento - Walcyr Carrasco


O casamento
É impressionante como esse ritual tão antigo nos toca

Walcyr Carrasco

Entro na sacristia embalsamado em um terno preto. O botão está perigosamente apertado sobre minha barriga. Tremo à idéia de que possa estourar como uma rolha de champanhe quando eu estiver no altar. Serei padrinho de casamento de meu amigo Rodrigo. Sou o primeiro a chegar. Precavido, corro para o toalete. Ando fazendo uma dieta sem sal. Diurética. Ai, que medo! Busco o masculino. Só encontro o feminino. Tranco-me lá dentro, já que ninguém está vendo. Quando saio, há uma fila de mulheres na porta. Disfarço. Os outros padrinhos chegam. Todos estão de camisa branca. Menos eu, que vim de azul. Sinto-me horrível. O noivo também chega. Abraça a todos, visivelmente emocionado. Meu amigo Murilo comenta:

– Está pingando sangue do seu queixo.
Verdade! Havia me cortado ao fazer a barba. Um grupo de madrinhas apressa-se a resolver meu problema.
– Bote o lenço!
– Tire o lenço!
– Jogue água fria!
É duro transformar-se no centro das atenções enquanto todo mundo espera! Finalmente, estanca por si mesmo. Respiro aliviado.
Uma senhora nos chama. Deveremos entrar em cortejo, em uma ordem definida. Dá instruções.
– Padrinhos do noivo devem subir para o lado direito do altar!
– Ahn?
Minha dama resolve:
– A gente segue o casal da frente. Se ele errar, erramos juntos!
O noivo confidencia:
– Estou nervoso. Você não está?
– Quem vai casar é você – respondo. – Por que eu estaria?
Todos riem. Acho que de nervosismo. A mãe do noivo pede um momento. Está chorando tanto que precisa refazer a maquiagem. Todos aguardam.

Saímos em cortejo. Na porta da igreja, a tal senhora dá um empurrãozinho no meu cotovelo. Entro. Oh! Toda a igreja, de pé, me observa. Penso em sorrir. Mas também não posso ficar arreganhando os dentes. Tento fazer uma expressão de beatitude. Que horror! Eu e minha dama somos mais largos que o corredor! Tento manter a dignidade enquanto caminho batendo o nariz nos arranjos de flores. Subimos ao altar. Erro meu lugar, é claro. Minha amiga Rosana, a madrinha da frente, me puxa para o local adequado. Ainda bem que não derrubei um castiçal, incendiando o vestido das madrinhas. Mas quase.

O noivo, trêmulo. Ouve-se a marcha nupcial. Ouve-se a marcha nupcial. Ouve-se a marcha nupcial. Ouve-se... sim, a marcha nupcial continua sendo ouvida, e nada de a noiva entrar. Deve estar na porta da igreja dando os últimos retoques. Finalmente, as portas se abrem. É uma das noivas mais belas que já vi. Nervosíssima! É entregue ao noivo. Começa a cerimônia. Sermão. Minhas pernas latejam. O padrinho do outro lado está olhando exatamente para trás de mim. Olhar fixo. Será que o teto está prestes a despencar na minha cabeça? Quase viro o pescoço. Consigo me conter. Tenho uma certa dificuldade em parecer um senhor sério e bem-comportado. Entra uma menininha com as alianças. Chorando! O noivo corre a pegá-la. Entrega-a à mãe, também presente no altar.

Ouço os "sim". As alianças são trocadas. O padre canta, em um belo momento. Os noivos choram. A cerimônia termina. Cada um deles vem nos cumprimentar. Sinto uma emoção inesperada. Quando o noivo me abraça, chamando-me de amigo, o meu aperto é forte também. Vejo quanto estão emocionados. As lágrimas escorrem. Percebo, então, como esse ritual tão antigo nos toca, e como os votos adquirem maior valor. Lá do fundo do meu coração brota o desejo sincero de que sejam muito, muito felizes!


Esta crônica foi veiculada na segunda edição do Wedding Guide.

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